quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Capital produtivo, capital financeiro, transnacionais e câmbio

Os anos 80 e 90 são marcados por uma transformação no cenário econômico internacional. O fim do Sistema de Bretton Woods com o seu plano de Bem-Estar Social “Welfare State” e política econômica Keynesiana de pleno emprego e maior participação do governo acabou lançando a maioria das economias mundiais em um sistema de desregulamentação, privatização e grande mobilidade do capital produtivo e financeiro, com altos índices de desemprego e crises sociais, resumindo, a economia neoliberal.

O 1º. e 2º. Consensos de Washington lançaram o ideário econômico, fazendo com que as economias nacionais seguissem linhas que acabaram enfraquecendo o poder dos Estados, não em questões militares, mas sim como fontes de estabilidade social.

Aqueles países que buscassem recuperar uma maior participação nas atividades econômicas, nos processos de planejamento econômico, acabariam sofrendo “sanções” do próprio sistema neoliberal, assim surgindo a idéia de “ou se está dentro do carrossel neoliberal ou se está isolado no mundo”, juntamente com países como Cuba e outras reminiscências do bloco comunista soviético, com exceção da China comunista de economia capitalista.

A economia neoliberal acabou minando o poder do Estado frente o processo de políticas públicas, visando a melhoria do bem-estar de suas populações à custa da lógica do desenvolvimento e expansão do capitalismo tanto produtivo como financeiro.

A lógica do capital substituiu a lógica do bem estar. O desemprego deu lugar ao capital volátil das grandes corporações transnacionais. Estas por sua vez, acabaram ampliando o processo de movimentação do capital produtivo, este sempre buscando novos locais mais baratos e propícios para a produção de bens manufaturados – lógica de um novo regime de produção – Toyotista (just in time) e do novo processo de produção dividida em diversos estágios, onde diversas partes de um produto são produzidas em diferentes partes do globo, sempre em busca de uma maior quantia de mais-valia maior frente a lógica de redução dos custos.

Regiões como a América Latina, que vinha recebendo vultosos investimentos de capital produtivo, sofreram com a perda dessas quantias frente o barateamento da mão-de-obra em outras regiões.

Por outro lado, ainda que o capital produtivo apresentasse uma mobilidade frente o desenvolvimento tecnológico que permitisse maior mobilidade juntamente com o barateamento da mão-de-obra, foi também o capital financeiro um dos grandes motivos de crise dos anos 80 e 90.

Nos anos 80 e 90 houve uma queda no processo produtivo frente uma crise do sistema de produção Fordista inserido em um regime Keynesiano, e uma ascensão do capital financeiro inserido numa lógica global de expansão monetária partindo da equação marxista D-D’, onde o capital monetário gera mais capital, sem passar pela etapa de produção de bem, ou a etapa da manufatura, que é encontrada dentro da equação D-M-D’.

Com menor controle de capitais ou maior mobilidade de capital estrangeiro, os Estados ficaram à mercê das altas ondas de investimento do capital financeiro que buscam sempre locais mais suscetíveis à sua expansão, frente uma flutuação das taxas de câmbio e políticas de taxas de juro.
Os investimentos tanto de carteira como IED (Investimento Externo Direto) acabam minando as políticas governamentais, pois pela lógica da economia neoliberal, o Estado deve apresentar uma intervenção mínima na economia, deixando que a “mão invisível” de Adam Smith do liberalismo clássico regule ou equilibre as flutuações financeiras. Porém na prática, o Estado fica refém dos movimentos especulativos que acabam minando os investimentos, gerando crises financeiras como a crise Asiática nos anos 90 que se arrastaram pelo resto do mundo, afetando o Brasil no início do século XXI. Dessa forma, essas crises acabam sendo movimentos de exportação de desemprego.

Alterações nas taxas de câmbio e juros poderiam trabalhar as crises provenientes da mobilidade do capital, porém dessa forma, a economia do Estado fica suscetível à movimentos especulativos, ou mesmo estariam sofrendo pressão para a não regulamentação. Tanto o câmbio como o juro, além de instrumentos financeiros de controle estatal são vistos como meios de investimentos de alto risco por parte de investidores que buscam ampliar o seu próprio capital. Graças ao desenvolvimento da tecnologia, temos ao mesmo tempo grande facilidade de investimentos (fundos de pensão, títulos públicos, ações) em qualquer região do mundo, e também pode haver a quebra da economia devido à fuga de capitais com um simples toque em um mouse. Devido a esse detalhe proveniente da terceira revolução industrial dos anos 70 e 80, os riscos de crise financeira são grandes frente o processo de acumulação de capital. As empresas transnacionais dão as cartas do jogo e os Estados se tornam os reféns. Para algumas pessoas isso é o processo de globalização. Sim, globalização financeira, porém não produtiva.

A globalização é financeira porque acabou reduzindo as distâncias dos centros financeiros, facilitando os grandes investimentos de capital volátil. Por outro lado, com a queda no processo produtivo decorrente da crise do sistema do processo de produção Fordista em um regime Keynesiano, o capital produtivo, diferentemente do financeiro, acabou tendo uma redução em sua expansão, causando um processo diferente da globalização, pois a mesma busca a idéia de um cenário com menores barreiras frente os investimentos e comércio, facilitando o comércio internacional. Assim, não há um processo de globalização produtivo, mas sim a internacionalização do processo de produção.

Os IEDs (Investimentos Externo Diretos) por outro lado, ainda que vistos como meios de desenvolvimento frente criação de empregos e “transferência de tecnologia”, acabam retornando quase que todo o lucro produzido dentro do país receptor para o seu país de origem, ou no caso das transnacionais, este lucro é reutilizado como meio de desenvolvimento de novos pontos de produção em regiões mais atrativas. Dessa forma, a internacionalização, da mesma forma que acaba gerando empregos vista investimento estrangeiro, acaba muitas vezes gerando um processo de “globalização de desemprego” em torno de países em desenvolvimento.

Novamente a lógica Norte-Norte aparece no desenho do cenário internacional, onde a lógica do processo de acumulação de capital configura as relações econômicas do mundo no século XXI.

Frente este cenário marcado por grandes divergências entre os ideais do pensamento neoliberal de Paul Volcker e as reais situações encontradas em países como México, Brasil, Argentina, e África como continente, assim como outras regiões, o questionamento feito é até quando haverá sustentabilidade desse processo.

Alguns economistas colocam que o capitalismo se encontra em crise, e que por volta de 2040 o capitalismo entre em crise profunda. Sendo uma crise como a dos anos 1870, do “crash” em 1929 ou mesmo dos anos 1970, a questão é – durante esse período de espera até a quebra do sistema, qual seria uma saída frente este cenário anárquico, onde há ausência de um “hegemon” ditando as regras do jogo. Pelo que parece os EUA de Bush não estão dando conta, e quando tentam, somente visam os seus próprios interesses, e a parte pobre, os primos pobres do G-7 sofrem, buscando adequar suas economias às teorias dos ricos.

* O texto acima é de inteira responsabilidade do autor.

Por que o estudo das religiões - uma breve análise

A ideia do presente artigo é realizar uma análise do capítulo “Why study religions?” produzida por John R. Hinnels, professor de estudos comparados de religião da Liverpool Hope University, e demonstrar como o entendimento da religião pode facilitar o as relações de indivíduos de diferentes crenças, assim como perceber, de forma breve, as influencias que a religião pode ter nos campos da política e da cultura.
John R. Hinnels inicia discutindo a religião dentro de uma perspectiva marcada pela idéia de perigo, mostrando que várias pessoas foram torturadas e/ou mortas devido aos apelos religiosos. Pode-se perceber diversos episódios onde a religião teve o papel de perseguição, tortura e até mortes em massa.
A religião, por outro lado, pode ser vista, nas esferas individuais e coletivas, como uma forma de apoio ou de ajuda. Seria a religião desta forma um instrumento para aliviar as dores mundanas e/ou espirituais dos indivíduos que a elas seguem.
Um terceiro ponto exposto pelo autor está inserido na esfera pessoal marcado por dois possíveis sentimentos – a. a religião vista como um fenômeno útil, positivo na vida da pessoa; b. a religião vista como um fenômeno que levaria a pessoa a se torturar (tanto fisicamente como mentalmente) quando tivesse sentimentos de culpa ou vergonha causados pela sensação de não atingir os princípios de uma determinada crença.
Após apresentar três perspectivas, Hinnels defende o estudo das religiões questionando se é possível entender determinadas culturas ou sociedades fora da esfera da religião, questionamento este que trás a tona necessidade de definir a religião, ponto esse que o autor coloca cerceado por um interminável debate, haja vista diversas vertentes que buscam definir esse campo.
Dentro do campo das definições, há teóricos que defendem a substituição da palavra religião pela palavra cultura, expondo que a idéia da palavra não faz alusão à objeto nenhum, ao passo que a religião, como prática, seria uma das estruturas internas da cultura. Outra vertente defende a religião como sendo polissêmica, onde Leandro Karnal se apresenta como um dos defensores dessa hipótese .
Saindo do campo da discussão do objeto, há a necessidade de entender o papel do religioso dentro do estudo das religiões. Inicialmente deve-se diferenciar o indivíduo religioso do indivíduo que estuda religiões. O religioso é membro de um grupo religioso, ao passo que o estudioso de religião não necessariamente crê em uma doutrina. Dito isto, pode-se entender o cunho da expressão tão comumente usada nos dias atuais – pensamento religioso – onde o indivíduo acredita que suas ações ou práticas estão de acordo com ideais de uma determinada doutrina. Não somente indivíduos podem ser religiosos, mas também organizações e instituições, dado o caráter defensor de uma crença específica.
Desta forma, a religião poderia ser entendida como um conjunto de práticas e idéias fundadas em uma crença defendida por um indivíduo ou uma coletividade.
Tais práticas religiosas estão fundamentadas na idéia de polissemia que a religião, para alguns, pode apresentar. Tal conceito ou característica produzido através de uma visão baseada na hermenêutica defende que as religiões podem ser aquilo que as pessoas entendem. Desta forma Hinnels expõe que as pessoas são aquilo que elas acreditam ser, o que poderia ser útil no entendimento do fundamentalismo religioso. Assim sendo, tem-se “[…]an act is a religious act when the person involved believes it to be associated with their religion. A religious thought is a thought which the thinker thinks in Zoroastrian, Christian[…]” (HINNELS, 2005: 07)
Com relação às práticas, a religião pode ser de forma vista isolada ou geralmente associada a outras dimensões. Uma das esferas que está quase sempre atrelada ao discurso religioso é o campo da política.
A história pode nos mostrar a importância da religião em momentos de fundamentação do pensamento político, ao passo que a própria política pode ser também um instrumento de concretização ou fortalecimento da própria crença. Determinados atos políticos praticados por religioso poderiam não ser entendidos ou enquadrado no campo do real, mas sim no campo da religião. Neste cenário, deve-se voltar ao entendimento de que as práticas ocorrem através da legitimação do pensamento religioso. Neste processo, a religião legitima o ato, e este pode ter uma conseqüência política. Ao legitimar o ato, o religioso não se sente culpado pois acredita que tal prática esta fundada na verdade da sua crença, não podendo ser questionada.
No campo da cultura a religião também apresenta as suas influencias. Para Hinnels, ao ter no mesmo plano a cultura e religião, o que se enxerga é um cruzamento entre as duas esferas, onde uma esfera complementa a outra.
Tendo como breve entendimento de cultura um conjunto de idéias e valores, e de religião um conjunto de práticas baseadas em uma crença, o questionamento de qual esfera influenciou a outra não se mostra de grande importância, ao entender que ambas se influenciam.
Para concluir este artigo deve-se ressaltar a importância do debate acerca do preconceito religioso. Hinnels defende que preconceito religioso é um dos fenômenos que permeia o mundo atual, devendo receber grande importância o estudo comparativo das religiões, possibilitando um melhor conhecimento das religiões, possivelmente reduzindo o preconceito.
Ao não conhecer um determinado fenômeno, há de se criar sentimento de medo, e é este sentimento de medo que alimentaria o preconceito, pois como o autor defende, “[...]If someone can develop an empathetic understanding of one another culture, the result will be that they are more ready to empathize with other cultures as well[...]” (HINNELS, 2005: 9).
CONCLUSÃO
Ao debater o estudo da religião pode-se entender que a mesma afeta as atividades de indivíduos e coletividades, influenciando dois campos de extrema importância para as sociedades humanas – a política e a cultura, e um melhor entendimento das doutrinas pode ajudar o debate acerca de questões como o fundamentalismo e o preconceito religioso.

BIBLIOGRAFIA
HINNELS, John. R. Why study religions In HINNELS, John R. The Routledge companion to the study of religion. New York: Routledge, 2005